No ano passado, atendi um jogador de vôlei que, após sentir uma dor intensa no ombro depois de uma partida, procurou um médico e recebeu o diagnóstico de uma lesão SLAP (Superior Labrum Anterior to Posterior). Essa lesão afeta o labrum superior da cavidade glenoidal, justamente onde o cabo longo do bíceps se insere. A recomendação médica foi cirúrgica, e ele acabou optando pelo procedimento.
Após a cirurgia, seguiu um protocolo de reabilitação com outro fisioterapeuta por seis meses, mas a evolução não foi satisfatória. Foi então que ele me procurou. Ao avaliá-lo, percebi que havia desenvolvido uma capsulite adesiva, ou seja, uma rigidez considerável no ombro. Expliquei a situação e iniciamos o árduo processo de recuperação da amplitude de movimento.
Com o tempo, conseguimos avanços na mobilidade, mas a dor persistia, especialmente nos movimentos de flexão, abdução e rotação lateral. Após 30 sessões sem grandes progressos na dor, sugeri que ele voltasse a jogar, mesmo com desconforto, administrando a dor com medicamentos e terapia manual, se necessário. Ele seguiu essa orientação.
Quase um ano depois, ele voltou ao consultório com uma nova queixa: havia rompido de vez o cabo longo do bíceps e precisaria passar por outra cirurgia. No entanto, ao fazer uma anamnese mais detalhada, notei algo curioso: ele não sentia mais dor. Pedi para ele executar alguns movimentos e, para nossa surpresa, a dor que o acompanhava há mais de um ano simplesmente havia desaparecido.
Expliquei para ele que, por mais contraintuitivo que parecesse, a causa da dor provavelmente era justamente o cabo longo do bíceps. Agora que estava rompido, seu problema poderia estar resolvido sem a necessidade de uma nova cirurgia. O bíceps é um músculo com dois tendões e um ventre volumoso, o que possibilita que as outras estruturas compensem sua função sem prejuízo significativo.